18 setembro, 2008

A EXPRESSÃO GRÁFICO-PLÁSTICA DE CRIANÇAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

RESUMO

Este projeto de pesquisa analisa o conhecimento do professor sobre o grafismo infantil a partir do ensino das artes-plásticas na Educação Infantil. Propõe investigar duas escolas na cidade de Aracaju/SE, sendo uma municipal e outra da rede particular, com realização prevista para o ano de 2008. Tem como matriz teórica, o debate sobre o Ensino das Artes Plásticas na Educação Infantil, focando o desenho da criança e sua interação com o mundo. Como problemática, saber se o professor proporciona a arte aos seus alunos de forma consciente e evolutiva, compreendendo, através do grafismo, o nível de maturação da criança, e que tipo de material didático a escola disponibiliza para a proposta de artes-plásticas. A metodologia é de abordagem qualitativa, de procedimentos que incluem a pesquisa bibliográfica, observação participante, pesquisa documental e entrevistas.

Palavras-chave: Grafismo; Desenho; Garatujas.


Na origem da história do ensino da Arte nas escolas públicas brasileiras, registra-se no fim do século XIX, a preocupação com a organização de uma elite que defendesse a colônia e movimentasse a cultura, tratava-se de um movimento apenas ilustrativo das camadas sociais mais abastadas que tinha por fim um eruditismo livresco e imitador da alta cultura dos países europeus, portanto o ensino artístico se situava no nível superior, antes mesmo do ensino primário e secundário.
Apesar do ensino da Arte no Brasil ter sido iniciado pela aristocracia francesa, foi a educação jesuíta que determinou o seu grau de valoração, porquanto valorizou as atividades literárias, demonstrando preconceito com as atividades manuais propostas pelas Artes-Plásticas. Também, alguns estrangeiros julgavam ilógico o ensino de Belas-Artes num país ainda não totalmente civilizado e economicamente frágil[1].
Assim, como meio de fortalecer a economia no Brasil, passou a ser valorizada a arte aplicada à técnica e à indústria, de modo que o Desenho tornou-se primordial tanto no ensino artístico quanto na preparação do povo para o próprio trabalho e desenvolvimento industrial. Mas também, o desenho frente à natureza, introduzido no Brasil pelo pintor alemão Georg Grimm[2], em 1874, passou a ser visto como educação do sentimento, cujo trabalho ao ar livre, provocou radical mudança nos métodos do ensino da Arte.
Frente à oposição entre Artes e indústria, o positivismo, movimento elitista burguês, iniciou o ensino da Arte nas escolas públicas, sob a orientação dos estudantes de Pintura e Escultura, bem como preparou professores para a realização das aulas artísticas, cujo fundamento dizia que,
A arte era encarada como um poderoso veículo para o desenvolvimento do raciocínio desde que, ensinada através do método positivo, subordinasse a imaginação à observação identificando as leis que regem a forma. (BARBOSA, 1995, p. 67).

Já na década de 1930, quando a escola e, portanto o ensino da arte estava sob a influência da Escola Nova e do educador Anísio Teixeira, principal responsável pela grande modernização da educação brasileira, a atividade artística foi usada apenas como uma linguagem complementar, cujo objetivo era fixar a aprendizagem de determinado assunto, através de desenhos e trabalhos manuais.
A prática de colocar arte (desenho, colagem, modelagem, etc.) no final de uma experiência, ligando-se a ela através de conteúdo, vem sendo utilizada ainda hoje na escola do 1º grau no Brasil, e está baseada na idéia de que a arte, pode ajudar na compreensão dos conceitos porque há elementos afetivos na cognição que são por ela mobilizados. (BARBOSA, 2003, p. 01).

Entre as décadas de 1920 e 1940, “a contribuição de Mário de Andrade foi muito importante para que começasse a encarar a produção pictórica da criança com critérios mais científicos e à luz da filosofia da arte”. (BARBOSA, 2003, p. 01). O escritor, poeta e professor, como diretor do Departamento de Cultura do município de São Paulo, criou parques infantis para filhos de operários, programa que, associava a arte ao cotidiano das crianças. Segundo o poeta ensaísta e modernista, “(...) Essa é outra característica essencial do desenho entre as artes plásticas: a sua rapidez expressiva. (...) o desenho nos toca do mesmo jeito que o som curto dos instrumentos de cordas dedilhadas, o piano, o cravo, uma guitarra”[3].
Posteriormente, na fase do estado político ditatorial no Brasil, tornou-se um empecilho para o desenvolvimento da arte-educação, de forma que apenas alguns procedimentos foram solidificados: o desenho geométrico no ensino secundário, o desenho pedagógico no ensino primário e cópias de gravuras utilizadas nas aulas de composição. Em virtude das medidas, começaram a aparecer alguns ateliês[4] para crianças, cujo objetivo era fazer com que liberassem sua expressão, manifestando-se livremente usando lápis, pincel, argila, tinta, etc.
Numa análise elaborada por Barbosa (2003, p. 05),
Por volta de 1969 a arte fazia parte do currículo de todas as escolas particulares de prestígio seguindo a linha metodológica de variação de técnicas. Eram, entretanto, raras as escolas públicas que desenvolviam um trabalho de arte.

Na década de 1980 a arte educação está representada por dois grupos: Arte de livre expressão, cujo objetivo é a criação despreocupada, sem intenção de formar o criador; e a Arte real, que estimula a valorização, a aprendizagem e a apreciação artística. Nesta, há uma atenção para que o aluno compreenda, segundo Castanho (apud SANS, 2005, p. 01),“como e o que os artistas têm procurado comunicar através da sua expressão”.
Nesse período a criança é vista como um ser que tem estrutura e mentalidade distintas da dos adulto, porém capazes de tornar favorável e viver sua própria realidade. Então, torna-se necessário que a sua produção artística seja compreendida como algo inerente à sua natureza, de maneira que não seja sufocada pelos anseios do adulto. Para Sans (2005, p. 25),
Ao comparar os desenhos feitos por crianças relativamente da mesma faixa etária, notam-se certas analogias, principalmente na representação da forma. No entanto, apenas de modo sumário, podem-se indicar aspectos que aparecem com certa freqüência. É interessante observar que, mesmo contendo semelhanças nítidas, isso se processa de modo pessoal, pois sempre prevalece o caráter criativo de cada uma.

A saber, como na aprendizagem, o desenho gráfico se desenvolve gradualmente. Aos 2 anos a criança se interessa pelo material didático, produzindo linhas simples e curtas, e em pouco tempo desenha curvas fechadas, espirais e círculos; aos 3 anos mostra mais controle em suas garatujas[5] e produz curvas, ziguezagues e círculos imperfeitos, além de descobrir que é possível relacionar sua produção com o seu ambiente, assim surgem desenhos que representam o sol irradiante e o rosto humano; por volta dos 4 e 5 anos a figura humana é produzida de forma mais minuciosa, composta por pés, mãos, umbigo, etc.; aos 6 anos deixa evidente em sua produção sinais da influência cultural em que está inserida e atribui significados aos desenhos. Também tem ampliada sua noção de espaço, utiliza base de apoio e passa a relacionar cores com os elementos representados; aos 10 anos há um amadurecimento crítico e utiliza a lógica em sua produção, perdendo aos poucos a sensibilidade natural. De acordo com Luquet[6] (1994, p. 130-131),
Ao observarmos desenhos de crianças, podemos aprender muito sobre o seu modo de pensar e sobre as habilidades que possuem. Quando num desenho os braços de uma figura humana saem da cabeça e não do tronco, por exemplo, isso significa que a criança que o desenhou ainda não tem construído interiormente, em seu pensamento, o esquema corporal de uma figura humana. Isso não tem nada a ver com o fato de ela não estar enxergando bem, de estar com problemas na motricidade fina, ou de ainda não estar apta a desenhar com destreza. Desenhar figuras humanas possibilita à criança estruturar sua idéia sobre a figura humana. No mesmo sentido, quando as crianças escrevem letras e algarismos espelhados, representam o que têm construído sobre as relações espaciais - se direita e esquerda, em cima / em baixo etc., não estiverem ainda integrados num todo em seu pensamento, o desenho ou a escrita refletirá necessariamente essa forma que ela tem de ver o mundo, e não aquela que a maioria dos adultos considera correta.

Assim, é preciso entender que não se deve interferir no desenvolvimento natural das crianças. “A maioria delas se expressa livremente e de forma original, quando não sofre inibição provocada pela interferência dos adultos” (LOWENFELD, 1977, p. 21). Logo, não só diante da possibilidade de desenvolvimento cognitivo, percepção, imaginação e sensibilidade, mas também pela oportunidade de apreciar e socializar as Artes-Plásticas na Educação Infantil, este Projeto de Pesquisa traz à baila a importância de conhecer o universo infantil por meio do grafismo, formas e cores, partindo do marco zero da representação gráfica, momento em que, segundo Piaget & Inhelder[7] (1994, p.132), “pouco a pouco, as crianças passam a atribuir significados a seus desenhos, nomeando-os”.
O professor proporciona a arte aos seus alunos de forma consciente e evolutiva, compreendendo, através do grafismo, o nível de maturação da criança? E que tipo de material didático a escola disponibiliza para a proposta de artes-pláticas na Educação Infantil? Esta problemática inicial nos convida a uma investigação, com o intuito de descobrir que tipos de propostas referentes às artes plásticas têm envolvido as crianças em sala de aula. Porquanto, oportunizar a arte na Educação Infantil é, além de trabalhar o cognitivo da criança, desenvolver sua percepção, imaginação e sensibilidade.
A saber, na aprendizagem, o desenho gráfico se desenvolve gradualmente, iniciando pelas garatujas, evoluindo para a elaboração da representação humana, noção de espaço, amadurecimento crítico, etc., por fim, quando a criança perde aos poucos a sensibilidade natural. Neste aspecto, Elizabeth Amorim (2005, p. 33), convida-nos a refletir, no sentido de que “a expressão gráfica é para a criança uma linguagem, como o gesto ou a fala. É a sua primeira escrita, visto que antes de aprender a escrever ela utiliza o desenho para deixar sua marca”. Percebe-se então, fundamentado no pensamento da autora, que este é um caminho que deve ser observado dentro desta problemática.
Então, a pergunta inicialmente lançada compõe o nosso problema e guia-nos no sentido de refletir não sobre o ensino das artes plásticas em sua totalidade, mas do ponto de vista da expressão gráfico-plástica, com o intuito de revelar a importância da leitura das garatujas para entender o processo do desenvolvimento infantil.
Acredita-se que, independente de classe social, toda criança expressa seus sentimentos e sua visão de mundo através do desenho, mas também há a suposição de que os professores desconhecem a importância da leitura do desenho, para entender o processo de desenvolvimento infantil.
A fim de que as hipóteses sejam comprovadas ou não, serão empregados procedimentos metodológicos de observação participante, entrevista e análise documental em duas escolas de Educação Infantil de classes sociais distintas. O propósito desta metodologia é vivenciar a realidade da importância do grafismo nestas fontes, bem como detectar suas peculiaridades.
Como objetivos gerais, a pesquisa irá investigar o conhecimento do educador sobre as etapas de desenvolvimento do grafismo infantil e de que forma suas atitudes favorecem o desenvolvimento das capacidades criativas dos alunos; examinar qual material didático é subsidiado pela escola para as aulas de arte na Educação Infantil; e comparar a expressão gráfico-plástica de crianças de duas escolas da Educação Infantil, sendo uma da rede municipal e outra da rede particular. E como objetivos específicos: categorizar o material didático que a escola disponibiliza para as aulas de arte; apontar de que maneira o professor propõe atividades de artes-plásticas em sala de aula (temas, imagens, leitura de obras, livros, etc.); identificar se o professor utiliza o material didático de arte ou insere de forma criativa algum outro material; examinar se a escola propõe a arte de maneira evolutiva da creche à pré-escola, detectando o nível de maturação da criança; investigar se as crianças se envolvem com a proposta do ensino de arte da escola e como elas vêem sua produção; relatar de que maneira a produção artística dos alunos é socializada.
Pretende-se indicar uma perspectiva de compreender ou ler a realidade, não com o propósito de firmar definitivamente uma verdade absoluta, contudo, estabelecer entre várias concepções, o panorama atual do grafismo, tanto na realidade infantil quanto na convenção docente, porquanto o projeto consiste numa pesquisa do tipo exploratória embasada pelos métodos de observação em equipe e análise documental.
A pesquisa bibliográfica teve como apoio o acervo da Biblioteca Central da Universidade Federal de Sergipe, onde foram selecionados “sites”, revistas e livros relacionados com o objeto da pesquisa – o grafismo infantil.
A concretização desta investigação se realizará mediante pesquisa empírica a duas escolas: a primeira, uma escola da rede municipal, localizada no Bairro Inácio Barbosa; a segunda, da rede particular, situada no Bairro Jardins. Esta freqüentada por alunos de classe média alta, aquela por alunos de classe baixa. A escolha tem como propósito comparar o desenvolvimento de crianças de classes sociais distintas, através do desenho gráfico, bem como analisar a competência, envolvimento e criatividade dos professores.
O contato com as fontes de dados proporcionará maior interação entre pesquisadores e os que constituem a situação investigada, caracterizando-se, inicialmente, como pesquisa participante. Será realizada análise documental do material didático utilizado nas aulas de arte, bem como a coleta de trabalhos desenvolvidos no cotidiano dos alunos, que evidenciem o grau de desenvolvimento em que se encontram. Para integrar esta metodologia de pesquisa qualitativa será empregada a técnica da entrevista, como elemento eficaz na coleta de dados que revele opiniões, sentimentos e postura de professores em relação à produção do grafismo infantil, bem como o comportamento das crianças diante da sua própria arte.



[1] BARBOSA (1995), Dos preconceitos contra o ensino da arte: Revisão do Século XIX.

[2] Georg Grimm foi um dos motivadores da valorização da pintura de paisagem e incentivador da pintura de observação direta da natureza na história da arte brasileira.

[3] Retirado do artigo O Mário das Crianças do Jornal da Unicamp.

[4] Denominado aqui como espaço de trabalho para o desenvolvimento artístico com as crianças.

[5] REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL: Conhecimento de mundo. “No decorrer do tempo, as garatujas, que refletiam sobretudo o prolongamento de movimentos rítmicos de ir e vir, transformam-se em formas definidas que apresentam maior ordenação, e podem estar se referindo a objetos naturais, objetos imaginários ou mesmo a outros desenhos.” (p. 92).

[6] G.H. Luquet - do texto “O Desenho Infantil” - inserido na obra da FUNDAÇÃO ROBERTO MARINHO. Professor da pré-escola. 3.ed. Brasília: MEC/SEF/DPE/COEDI, 1994: 131-132.

[7] Piaget & Inhelder - do texto “A Psicologia da Criança” - inserido na obra da FUNDAÇÃO ROBERTO MARINHO. Professor da pré-escola. 3.ed. Brasília: MEC/SEF/DPE/COEDI, 1994: 132.



REFERÊNCIAS

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_______. Arte Educação no Brasil: do modernismo ao pós-modernismo. Revista Digital Art&, n. 0, out. 2003. Disponível em: <>. Acesso em: 18/11/2007.

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COSTA, X. C.; SILVA, R. S. M.; MELO, N. C. G. As artes plásticas no processo de socialização de crianças internas: relato de uma prática pedagógica na pediatria do Hospital Universitário. Conceitos. Jul. 2004 – Jul. 2005. p. 151-155. Disponível em: . Acesso em: 18/11/2007.

FILHO, M. A. O Mário das Crianças. Jornal da Unicamp. Edição 310. 28 nov. a 04 dez. 2005. Disponível em: . Acesso em: 25.03.08.

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LOWENFELD, V. A criança e sua arte. 2. ed. São Paulo: Editora Mestre Jou, 1977.

MIELZYNSKA, M. A. Arte ao Alcance da criança: Arte: ampliando horizontes e formando cidadãos. Associação Artensino. São Paulo. Disponível em: . Acesso em: 18/11/2007.

PIMENTEL, L.G. (Coord.). Som, gesto, forma e cor: dimensões da arte e seu ensino. Textos de: BARBOSA, A. M. et.al. 4 ed. Belo Horizonte: C/Arte, 2003.

SANS, P. T. C. Fundamentos para o Ensino das Artes Plásticas. Campinas, SP: Alínea, 2005.

V CONGRESSO NACIONAL ARTE E EDUCAÇÃO NA ESCOLA PARA TODOS. Ano 12. Edição Especial/ 2000.

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